Mosaicos

Hoje estava pensando em minha gratidão as pessoas que tenho oportunidade de conhecer através do mosaico.

Exemplifico, então com nomes figurativos.
Tenho uma aluna linda! Ana não vem ao meu atelier, eu é que vou até ela.
Quando Ana chega em aula, parece que o ambiente que já é aconchegante, se ilumina.
Ana é daquelas que abre a porta sorrindo, tem olhos negros brilhantes, uma vida que não foi de todo fácil, mas ao seu olhar, se torna eloquente.
Em seus relatos de uma vida simples do interior, revela as pessoas com grandiosidade. Jamais desqualifica algo ou alguém, seu foco é no positivo que o outro oferta em sua individualidade.
Ana conta por exemplo, do gosto do pai pelas maçãs argentinas, grandes e brilhantes, que levava para ele e eram recebidas como  iguarias.  Como forma de agradecimento e cumplicidade, o pai colocava então pequenos chocolates quase que furtivamente nos  bolsos dela quando a visitava no  trabalho.
Assim são suas histórias, que escuto sem perceber o tempo passar.
Ana canta durante a aula. Sim, porque fez aulas de canto para aquecer ainda mais sua alma.
Ana só não é mais linda porque disseram um monte de bobagens para ela há muitos anos atrás e ela as vezes ainda acredita.
Ana compartilha seus mimos com total desapego, inclusive sua caixa de milifioris ( só um mosaicista brasileiro sabe o quanto isso é difícil).
Bem, mas a história inicia com a visita de Ana a uma amiga. Sabe encontro de amigas? Aqueles que revelamos coisas boas e não boas, no que vemos e percebemos. Na bagunça do pátio, vários pedaços de madeiras jogadas e sem utilidade, oferecidas para o novo Hobbie da amiga, mosaicos.
Um mdf pequeno, um semicírculo, sem nenhum significado.
O mdf doado,  seus potinhos de pedras e na companhia do gato,  vai surgindo um trabalho delicado, cuidadoso com o requinte de uns pequenos filetes de ouro do  Orsoni que ela mesma escolheu para compor sua obra.
Aos meus olhos, linda!

O trabalho é relativamente pequeno e Ana pede se eu conseguiria para ela uma moldura, em madeira de demolição.

Vamos então ao terceiro elemento da minha história, o seu João.
O seu João é marceneiro. Estudou nas melhores escolas da cidade com grande dificuldade de aprendizado, até descobrir que possuía dislexia. Uma dificuldade que entre outros aspectos afeta a leitura, percepção de dimensões, de operações aritméticas...
Com a experiência, criei um relacionamento interessante com o seu João.
Descobri que apesar de sua desorganização e dificuldade de memória, quanto menos detalhes dou a ele, melhor o trabalho fica pois é extremamente criativo.
A marcenaria do seu João não é bem uma marcenaria, trata-se de um lugar cedido, na amizade, há muito tempo. Quando vou visitá-lo, percebo que o teto está caindo e torço para que ele lá não esteja quando isso ocorrer.
O espaço do seu João foi assaltado várias vezes e sempre levam suas ferramentas.
A aluna queria  uma moldura em demolição para valorizar o trabalho,  deixou livre todo o mais.
Seu João,  nem serra circular tem, mas aceitou o trabalho e disse que faria. Pasmem!  Para o final da tarde.

Sempre que busco os trabalhos no seu João, vou aberta. Ele já fez trabalhos pelo lado inverso, perdeu medidas...
Mas como seu João também é muito aberto, junto cocriamos e o resultado quase sempre é muito bom.

Fim da tarde, antes do consultório, passei rapidinho no seu João  e vejam o resultado!
Maravilhoso! Seu João.

É por isso que quando penso em mosaico, nas aulas, as vêzes tenho dificuldade de explicar meu amor.

É pelas Anas, pelos seus João, pelas histórias, pelos relatos..

Esses dias, no final de uma aula, fiz uma pergunta de Psicóloga. Queria saber de sentimentos, era a primeira aula daquele grupo aos sábados, então pedi para que dissessem em uma palavra como estavam se sentindo ao sair.
Foi quando uma aluna respondeu: Capaz!  Estou me sentindo Capaz!
Para mim, foi suficiente.



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